Entrevistado pelo
Blog do Boleiro, Dunga diz que não teme ser demitido e que tá tudo planejado para a clssificação da seleção para as Olimpíadas - e para a Copa.
Dunga, como você está?
Tranqüilo. Estou puto, mas estou tranqüilo. Sei que querem a minha cabeça porque criei uma zona de desconforto para quem estava acostumado a cobrir a seleção brasileira sem sair de casa. Porque tinham a escalação, o time, as preferências do treinador. Mas isto mudou.
De quem você está falando?
Queira ou não queira, a poderosa manda e os caras que trabalham para ela acham que mandam. Não digo que seja a TV Globo, mas alguns profissionais que trabalham lá e estavam acostumados com privilégios e não têm mais. Lá nos Estados Unidos, vieram pedir para entrevistar um jogador à uma da manhã. Disse não. Eles foram à loucura. Um câmera ficou dizendo que ia falar com A, B ou C, mas falei que não. Não tenho culpa se os caras chegaram atrasados em três dos quatro treinos que dei. Não é meu problema se o cara perdeu a hora passeando no shopping. E eu disse para o cara: “Não vai jogar a responsabilidade em cima de mim”. Depois dizem que o Dunga é carrancudo. Tenho senso de justiça.
As relações entre você e os jornalistas estão estremecidas?
Comigo, os repórteres perguntam tudo e eu respondo tudo. O que fiz foi atender o que 95% da mídia pediu e 100% da população brasileira queria: coloquei ordem, acabei com a festa que foi na Copa do Mundo de 2006. E estou atendendo o que o meu patrão determinou.
Mas a reclamação não é só dos profissionais da Globo.
Veja como são as coisas. Os caras que a vida toda reclamaram dos privilégios de uma emissora, agora se juntam com ela para meter o pau. Quem reclamava das tendas de algumas tevês que cobriam os treinos e faziam entrevistas na hora que queriam, agora tem tratamento igual. Mesmo assim, reclamam. Mas não vou dar nada para ninguém. Mas está tudo dez. Sei que os caras vão fazer leitura labial comigo, mas não mudo de posição. Estou tranqüilo.
Você está na corda bamba?
Já disse. Esta pergunta deve ser feita para o presidente da CBF. Mas, veja bem, quando o Ricardo Teixeira me contratou, ele deixou claro que nossa conversa seria direta, sem interlocutores. Falo direto com ele. E não fazemos nada sem planejamento. O Ricardo recebe relatórios de tudo o que vamos fazer, quem convocamos, porque convocamos, qual o nosso objetivo. Funciona como uma empresa.
Quando você conversou com ele pela última vez?
Ontem à noite, por telefone.
Você sabia da convocação do Ronaldinho Gaúcho para a Olimpíada?
Esta idéia vem amadurecendo na comissão técnica há três meses. Passamos para o presidente Ricardo Teixeira e ele assumiu o encaminhamento dela. A gente teve que deixar o cara bater no fundo para ajudá-lo. Mas eu não podia ir até o jogador, me expor. Por isso, o Ricardo disse: ‘Deixe que eu mesmo falo com ele’. Ele não está machucado. Mas não joga há três meses. Por isso, o Paulo Paixão (preparador físico) vai trabalhar com ele. Agora, o Ronaldinho sabe que vai viajar na classe econômica, junto com o resto do time. E tem que estar disposto a treinar.
O que você pode dizer sobre este caso do Kaká? Você está realmente chateado com ele?
Não estou. Eu quero contar com os melhores. Não sou maluco. Não sou doente. O que eu falei foi o seguinte: ele precisa estar bem para disputar os dois jogos das eliminatórias. O que eu ouvi foi que para o primeiro jogo não dava e talvez desse para o segundo. Aí não seria possível. Ele não está bom para jogar hoje.
Ele disse no programa “Bem Amigos”, no Sport TV, que não gostou muito do jeito como foi cortado.
É mas ele mesmo disse também que jogou machucado em 2006 e não faria isto mais. Mas eu pergunto: por que jogou cinco meses no Milan com o problema no joelho? O que eu ouvi era que ele talvez pudesse, talvez não pudesse jogar os dois jogos. Ou tem ou não tem condições. Ou então chega e diz “eu vou pro pau”. Agora, para impedir o Kaká de ir à Olimpíada, é o Milan que decide. Mas para jogar nas eliminatórias, é o Kaká que decide.
O que houve então, um mal entendido?
Eu sempre digo aos jogadores que eles só podem acreditar naquilo que sai da minha boca. Só vale quando eu falar. Nunca disse que não queria o Kaká ou o Ronaldinho Gaúcho. Quero contar sempre com os melhores. Quero os melhores, em condições de jogar.
Mas o Ronaldinho nem está jogando.
Esta situação é uma exceção, fizemos um planejamento para ele jogar. Para mim, todo mundo é importante, do Júlio César ao Ronaldinho, passando pelo Maicon, Lúcio, Juan, Anderson, todo mundo.
No meio desta situação, a Olimpíada veio para atrapalhar?
Não vai atrapalhar, vai ajudar.
Mas até para este amistoso no Rio você já teve que dispensar dois jogadores.
O Fluminense divulgou quando ia viajar para o Equador? Não. Quando eles pediram a dispensa do Thiago Neves e do Thiago Silva, não me opus. Não vou atrapalhar a vida de ninguém.
Vocês dispensaram o Alex Silva e o Hernanes do São Paulo?
Não. Até porque ninguém falou comigo. Se falassem comigo, dissessem que precisam deles, a gente podia fazer um acordo. Eles jogariam uns 60 minutos no sábado e eu os colocaria para jogar uns 40 minutos no domingo.
Esta má fase que a seleção está passando não pode queimar jogadores como, por exemplo, o Diego?
Eu sempre digo: seleção é pressão. O cara não pode se queimar. Eu dou oportunidade. Veja o caso do Luisão: nos quatro anos antes de eu assumir, ele jogou dois jogos pela seleção. Comigo, em dois anos, já disputou seis. É saber aproveitar. Tem cara que diz que precisa de sequência de jogos. Isso vale para times e não para seleção. Seleção é confiança. O jogador tem que dizer “tenho cinco, dez minutos para jogar e vou dentro”. Viu o Anderson? Como ele entrou contra o Paraguai?
Contra o Paraguai, a seleção não conseguiu parar o contra-ataque e a jogada de bola parada.
Isso é o mesmo que dizer que a Itália joga no contra-ataque. Todo mundo sabe disso. A gente sabia que o Paraguai tem essa característica. Mas sofremos dois gols em falhas que acontecem no jogo. Contra a Argentina, sabíamos que dos oito gols que eles tinham marcado nas Eliminatórias, seis foram em jogadas de bola parada. No Mineirão, eles repetiram estas jogadas várias vezes. O que aconteceu? Nada. O time melhorou. Comparando com os argentinos, eles somaram dois pontos e nós um nestes dois últimos jogos.
O Brasil não jogou mal?
Contra a Venezuela, jogou mal mesmo. Contra o Paraguai não fomos bem. Mas contra a Argentina, o time melhorou. A gente queria ganhar o jogo, mas enfrentamos a Argentina.
Por que você não aproveitou os amistosos nos EUA (contra Canadá e Venezuela) para testar jogadores em idade olímpica?
É outra crítica que fazem sem saber que planejamos tudo, pensamos antes de tomar decisões. Para as eliminatórias, os jogadores estavam no final de temporada, 15 dias parados. Se coloco um time olímpico, eles iam ficar mais 15 dias. Como o time poderia ir bem nas eliminatórias? Assumimos um risco calculado. Se a gente tivesse certeza seria melhor.
Você está se sentindo pressionado?
Não pela CBF. Sei que os caras querem me botar contra a parede para que eu ceda. Mas não vou mudar. Já me reuni com eles, eles falam que tem os melhores profissionais, os melhores equipamentos, mas isso não muda nada do que me propus fazer na seleção. Queriam seriedade e temos seriedade.
Os jogadores entendem isso?
O grupo é muito responsável. Temos alguns atletas experientes como o Gilberto Silva, Gilberto, Lúcio e Juan que orientam os mais novos. Eles sabem que só quero que eles tenham responsabilidade. Trato os caras com o maior respeito. O próprio grupo puxa quem está se desviando um pouco. É uma tarefa importante jogar pelo Brasil. A situação do país requer algumas mudanças. Tenho a oportunidade de mudar esse aspecto. Ninguém leva vantagem aqui. Para mim, o que vem primeiro é a seleção brasileira.
Você teme ser demitido?
Sou bem sucedido na vida. O que tenho dá para viver. Sempre digo que Deus me deu um dom, que é o de jogar bola, e eu acrescentei algumas coisas. Eu estou na seleção porque sempre achei que seleção não é escolha, é missão. Para mim, primeiro é o trabalho e não o emprego. Mas estou tranqüilo. Aquilo que me propus a fazer, renovação e o fim das mordomias de alguns setores da mídia, estou fazendo.